O Abandono do posto de trabalho: análise comparativa entre as legislações francesas e portuguesas
-O abandono do posto de trabalho por um funcionário era uma situação desconfortável para o empregador em França até a adoção da lei sobre o marcado do emprego em 21 de dezembro de 2022. Com efeito, o empregador que pretendia pôr fim ao contrato de trabalho dum empregado que abandonou o seu posto de trabalho devia desenrolar todo o processo de despedimento por facto imputável ao trabalhador alegando uma justa causa. Com o novo procedimento plasmado nos artigos L. 1237-1-1 e R.1237-13 do código do trabalho francês, a França aproxima-se dos preceitos portugueses em matéria de abandono de posto de trabalho que já estão vigentes desde 2009 em Portugal. Assim, o novo diploma implementou no direito francês o conceito de presunção de abandono do trabalho que já estava estatuído pelo número 2 do artigo 403.° do código do trabalho português nos seguintes termos: “Presume-se o abandono do trabalho em caso de ausência de trabalhador do serviço durante, pelo menos, 10 dias úteis seguidos, sem que o empregador seja informado do motivo da ausência”.
Em princípio, considera-se que há abandono do trabalho quando a ausência do trabalhador do serviço é acompanhada de factos que, com toda a probabilidade, revelam a intenção de não o retomar. No entanto, a legislação, de ambos os países, permite ao empregador de recorrer ao mecanismo da presunção de abandono do trabalho. Desta forma, só é suficiente cumprir os requisitos legais necessários a instanciação da presunção para obter a efetivação da denúncia do contrato de trabalho em caso de abandono do posto. Os requisitos consistem nos dois países no respeito de um prazo mais o menos longo e na interpelação do empregado por carta registada com aviso de receção. Em Portugal o prazo é de 10 dias úteis seguidos de ausência e em França são pelo menos 15 dias sem resposta do empregado. Em Portugal o abandono do trabalho só pode ser invocado pelo empregador após comunicação ao trabalhador dos factos constitutivos do abandono ou da presunção do mesmo, por carta registada com aviso de receção para a última morada conhecida deste. Em França, o empregador também deve enviar uma carta registada com aviso de receção, que serve para iniciar o desconto do prazo de 15 dias, permitindo ao empregado de justificar da sua ausência do posto de trabalho. Só se o prazo for levado a cabo sem justificação do empregado é que a presunção de abandono do trabalho devirá eficaz.
Não obstante a notificação da carta interpelativa pelo patrão, o empregado ainda pode tentar ilidir a presunção de abandono do posto de trabalho. Em Portugal, não basta ao trabalhador comunicar os motivos da ausência, este tem que provar que houve um motivo de força maior que o impossibilitou de efetuar a comunicação da sua ausência atempadamente. Em França, o empregado pode prevalecer-se dum motivo legitimo para tentar refutar a presunção. Já não carece de justificar dum motivo de força maior. Podemos aqui sublinhar a diferença de exigência entre os dois países. O empregado em França tem um leque de motivos legítimos mais extenso à sua disposição para aniquilar a presunção de abandono do trabalho. Em caso de litígio sobre a pertinência do motivo invocado pelo trabalhador, é o tribunal do trabalho que será competente para tratar do assunto. Em França, nesta matéria, o tribunal tem obrigação de julgar o caso e prolatar a sentença no prazo de um mês a contar instauração material do processo.
Na hipótese de não existir motivos justificadores da ausência, o abandono do posto de trabalho é, perante a lei de ambos os países, interpretado como uma forma de cessação do contrato por iniciativa do trabalhador. Outrossim dito, o abandono é equiparado à denúncia do contrato de trabalho pelo empregado. Nesta ocorrência o empregado não tem direito a qualquer indemnização. Pelo contrário, em caso de abandono do trabalho, o trabalhador deve indemnizar o empregador. Em Portugal o empregador será ressarcido nos termos do artigo 401.º do código do trabalho que é relativo à denúncia do contrato pelo trabalhador sem respeito do prazo de aviso prévio. Em França, a indemnização do empregador é mais circunscrita. Em conclusão, qualquer for o país, o empregador deve acatar com o devido rigor a legislação referente ao abandono do posto de trabalho e ter uma particular atenção com as menções que devem constar da carta interpelativa.
Dr. Pedro Emanuel de OLIVEIRA
Advogado
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